A CULPA É DO SULFITO?
O uso do dióxido de enxofre (SO2)
para a elaboração de vinhos se iniciou ao final do século XVIII. Virou o
queridinho das vinícolas por causa de suas varias propriedades, a facilidade de
emprego e o baixo custo. Os sulfitos sao conhecidos desinfectantes,
anti-sépticos e anti-bacterianos, antienzimático, selecionador de leveduras e
preservador da cor. Alem de claro, atuar como conservante de produtos
alimentares.
Um dos grandes “milagres” do sulfito é minimizar o
efeito da oxidação pelo oxigênio. O que, no vinho, pode ser em algumas
situações considerado um efeito benéfico. Desde a época medieval ele já era
utilizado na forma de velas queimadas dentro das barricas.
Cotrolar os processos- principalmente as fermentações e
as leveduras- e conservar a saúde
do vinho – no que se conhece mercadologicamente – são as principais “vantagens”
do sulfito.
Lindo, não? Mais ou menos.
O dióxido de enxofre é um composto químico constituído por dois átomos de oxigénio e um de enxofre. É teoricamente um gás denso, incolor, não-inflamável e altamente tóxico, no mundo dos conservantes também como
INS 220 e 202.
A sua inalação pode ser fortemente irritante, causando por exemplo, muitos
casos de broncoconstricao por inalacao. Traducao: falta de ar, em menor ou
maior escala.
Mas esses problemas respiratorios tambem podem ocorrer com a ingestao de
sulfitos, e nao somente com a inalacao. Por isso muitas pessoas asmaticas
relatam piora nas crises quando ingerem alimentos sulfitados ( eu, por exemplo…
mas demorei a descobrir isso…. rs)
Muitas pessoas que sofrem de enxaqueca relatam o agravamento da
crise após tomar vinhos, mas na verdade a crise é causada por estes conservantes, e nao pelo vinho em
si. Na verdade, ate mesmo pessoas que nao sofrem de enxaqueca relatam
serias dores de cabeca depois de ingerir vinho. Vinho? Pe-ra-la. Na maior parte
das vezes a dor de cabeca eh resultado de uma sensibilidade aos sulfitos. Pois
eh. O alcool, no fim das contas, eh um dos componentes menos toxicos quando
comparados aos conservantes e aos agrotoxicos que consumimos “ no pacote”,
quando ingerimos uma taca de vinho.
Teoricamente, os sulfitos podem fazer alguns estragos no nosso corpictho: destruir a tiamina
(ou seja, vitamina B1), essencial à função do sistema nervoso, ao aprendizado
normal e à digestão. Os sulfitos também
inibem o fígado de metabolizar o álcool da melhor maneira ( ele é conhecido
inibidor do tal do citocromo ch450, que metaboliza alguns tóxicos no nosso
fígado. Ou seja, a grosso modo, ele tenta “atacar” o sulfito, que é tóxico, e
deixa o álcool de lado, passeando pelo metabolismo). Por isso que quanto mais
conservantes tiver um vinho, mais lentamente ele vai ser metabolizado pelo seu
corpo- e o álcool fica mais tempo no seu organismo. Tradução: Ressaca das
bravas.
Vários outros sintomas
são relacionados ao consumo e/ou a sensibilidade aos sulfitos: asma,
baixa de pressão , ondas de calor, distúrbios intestinais, taquicardia,
fraqueza e ansiedade. As crises de enxaqueca, principalemente para quem já tem
a propensão, vão muito alem das
dores de cabeca. Elas vem acompanhadas de
náuseas, vômitos, fotosensibilidade, visão embaçada, irritabilidade,
sensibilidade a cheiros e a barulho,
falta de concentração, tonturas, obstrução nasal, tensão muscular e até
diarréia.
Claro que há muitas outras substâncias naturais como taninos,
histaminas, prostaglandinas e bactérias que podem dar dor de cabeça. Mas o FDA calcula que
1% das pessoas são sensíveis a esses compostos, embora você possa desenvolver
uma hipersensibilidade aos sulfitos em qualquer momento da vida – e os
resultados podem variar de brandos a … causadores de risco de vida.
O uso de conservantes é regulamentado pela Agência
Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que determina quais são
permitidos. A quantidade
autorizada muda de acordo com cada alimento ou bebida. Sucos podem ter uma concentração de até 0,02g de SO2 por 100ml de
produto final, enquanto nos vinhos a concentração pode ser mais alta, de 350ml
por litro.
A Dose Diária Admissível
(D.D.A.) é de 0,7 mg/kg/dia determinada pela Organização Mundial da Saúde, ou
seja, as doses aceitáveis para o consumo humano encontram-se entre 42 a 56
mg/dia para uma pessoa entre 60 e 80 Kg. Na Comunidade Econômica Européia, o
limite autorizado para vinhos é de 160 mg/L para vinhos tintos e 210 mg/L para
vinhos brancos.
Já
no Brasil, até o momento, se admite como máximo um teor de 350 mg/L de SO2
total, embora muitos produtores de bom senso façam com que eles girem na casa
dos 100mg/L. Mas a grande maioria, principalmente dos vinhos mais simples,
ficam ali quase no limite.
Fez
as contas? Sim.
Se pegarmos a sulfitagem
máxima permitida no Brasil, com aproximadamente duas tacas de vinho você já
estoura a quantidade máxima permitida. Agora….. você se lembrou que não esta
contabilizando todos os outros produtos industrializados que a gente consome?
Todas as outras coisas que contem conservante?
Sim.
É assustador. Se formos fazer as contas de tudo, estamos ferrados. No geral, ingerimos
muito, mas muito mais do que o maximo permitido pela OMS.
Claro que, em quantidade
mínimas, o sulfito não vai matar ninguém. Ou, se isso acontecer, vai ser um
caso isolado. Se não, tinha também muito enólogo por ai morrendo por passar a
vida inteira trabalhando com isso.
Outra coisa: não adianta
sair por ai comendo alimento orgânico e tirando o sulfito da sua vida se você
fuma, come mal, se estressa e não cumprimenta seu porteiro. Isso eu falo
sempre.
Mas a questão é que não
se sabe ao certo, ate que ponto, quando, onde e porque. Não temos uma exatidão
para dizer ate quando e em qual exposição o sulfito, assim como outros
conservantes, poderiam “não fazer tão mal”m tendo em vista que vivemos em uma
sociedade onde ingerimos conversantes praticamente em tudo.
A questão da sulfitagem
nos vinhos é apenas uma das varias intervenções feitas nos vinhos, nem sempre
“tão” benéficas assim para nosso organismo.
Para colocar mais lenha
na fogueira, se não fosse pelos conservantes e agrotóxicos, talvez não tivéssemos vivido a grande
expansão da industria vinhateira dos últimos tempos, levando vinhos para
mercados que não sonhavam em produzir vinhos e gerando uma quantidade enorme de
rótulos e desenvolvendo novas vinícolas.
O desenvolvimento pode
vir sem um tiquinho de veneno? Realmente, eu não sei. Também não sei ate que
ponto a expansão da industria em escalas robóticas é tão benéfica assim para
todos. Me parece que existe uma ilusão de “progresso” por trás da
industrialização.
É inegável que sem
muitos dos “veneninos”, não estaríamos nem discutindo sobre isso nos dias de
hoje, pois o mercado de vinhos seria reduzido, em sua maior parte, a vinhos
regionais e de pequena produção.
Agora, eu, sinceramente,
não veria mal nenhum em ver o mercado reduzido a vinhos de pequena produção e
regionais…rssss mas seria muito indelicado da minha parte querer que minha
“verdade” seja a verdade de todo mundo.
De qualquer forma, como
o radicalismo em qualquer assunto acaba nunca sendo a melhor solucao, para mim,
quando se trata de aditivos químicos, o jeito é reduzir. Usar o bom senso. Da
mesma maneira que os produtores de vinho estão em uma onda “saudável” em
reduzir as aplicações de tóxicos nos vinhedos, na hora da vinificação isso
também esta sendo feito. Redução na aplicação de sulfitagem e conservantes nos
vinhos. Por exemplo, algumas vinícolas diminuem o uso de conservantes
intensificando o cuidado com o lacre ou com a rolha, evitando assim um “ataque”
muito intenso do oxigênio. Tampa rosca e cera são os mais utilizados.
Não da para olhar para
trás e ficar chorando o leite derramado ( ou no caso, as grandes quantidades de
tudo-quanto-é-coisa que já foi colocado no solo, na agricultura e nos vinhos.
Mas o que podemos fazer
é olhar para frente e procurar fazer um mundo mais “saudável” e mais puro.
Seja ele organico,
biodinâmico, sustentável, natural, ou simplesmente um produtor com bom senso, a
grande vantagem e o que devemos nos preocupar, sendo radicais ou menos
radicais, é ingerir menos compostos tóxicos ao organismo.
Sou contra os “rótulos”
e classificacoes nos vinhos. Pois isso, hora ou outra, vira marketing burro. A
concientizacao e a preocupação com a saúde – nossa e do meio ambiente – ainda é
a melhor resposta para tudo.
Agora, vamos a outro
ponto bastante polemico. O sulfito não e utilizado no vinho apenas na hora do
envase, para conservação. Existe um processo de sulfitagem pré fermentativa,
para “matar” as leveduras selvagens e/ou indígenas. Eliminando as leveduras
naturais da uva, o produtor pode utilizar as leveduras selecionadas que ele
considera mais adequadas para o seu vinho. Um saquinho de leveduras que é
despejado no tanque de fermentação.
Dessa maneira, existe o
controle quase total do processo fermentativo, pois as leveduras selecionadas
são feitas para se comporta da maneira esperada pelos padrões da industria de
vinhos; e ate na hora de fazer uma segunda fermentação malotalica, o enólogo
pode utilizar SO2, uma vez que as bactérias lacteas são sensíveis ao SO2. Alem
disso, o enólogo pode “escolher” algumas caracteristicas para o seu vinho, que
são proporcionadas pelo tipo de levedura utilizada. Uma levedura da mais gosto disso,
outra levedura da mais gosto daquilo, etc.
Muito dos aromas e
sabores que consideramos normais ou naturais ao vinho, na verdade são
“fabricados” através da fermentação com leveduras selecionadas. Ate a cor do
vinho que conhecemos é produto da intervenção com sulfito. Vinhos brancos sem
sulfitagem ficam mais escuros, e os vinhos tintos, mais claros. Ação do
oxigênio.
De novo, o limite entre
o que foi estabelecido como padrão pelo mercado e o que é o processo mais
natural, é muito complexo. Muita gente pega um vinho feito sem sulfito e acha
estranho, por causa da cor, e dos aromas. Assim como as leveduras. Aparecem
cheiros e sabores “estranhos” ao narizes treinados com vinhos feitos com
leveduras selecionadas.
Por isso que uma boa
maioria dos Sauvignon Blanc da America do Sul tem gosto e cheiro de maracujá e
parecem o mesmo cachorro mas com outra coleira. Leveduras selecionadas que dão
o mesmo gosto pra tudo. E uma boa dose de sulfito para matar as leveduras
provenientes do vinhedo ou da adega ( chamadas de residentes ), alem de outra
boa dose para conservar o vinho e manter sua cor.
É mais fácil de
controlar o processo com a levedura selecionada? Inegavelmente que sim. É muito
mais fácil manter um padrão utilizando esses métodos? Não preciso nem comentar.
Claro que sim. Padronificacao é sinônimo de industrialização. Não existe
padronificacao 100% em um método artesanal, isso todo mundo sabe. Mas isso
acaba matando um pouco a autenticidade e as caracteristicas inerentes a uva e
ao terroir, alem de um pouco do que o vinho tem de mais mágico. A
individualidade e a alma do lugar. A boa e velha discussão de sempre.
Por isso, pesquisem,
leiam, conversem.
O sulfito não é o único
vilão da historia. Alias, ultimamente, existem grandes industrias vinícolas que
utiliza substancias tidas como ilegais – e que são ate mais perigosas – em
muitos países. O Vecorin, da Bayer, por exemplo. Em muitos lugares ele é
permitido para higienização de maquinários, mas muita gente acaba adicionando
ao vinho como conservante, no lugar do So2. Alias, tomo o sulfito como exemplo
pois é um tema palatável e bastante presente nos fóruns de discussão de hoje em
dia. Alem de ser o conservante mais conhecido no meio do vinho.
Minha sugestão: tomem
suas próprias opiniões sobre esse tema. Conhecimento é tudo nessa vida.
A minha eu já tenho.