Leveduras Selvagens: Cachaçaria Excelência, Passa Quatro de Minas.
E eu me descobri uma boa cachaceira. Dica do Rafa da Bocaina, também. Dica não, gole. Pois a gente acabou com algumas garrafas antes de conhecer o Guilhen, responsável pelo projeto. O que foi ótimo, pois assim testei o produto na pele antes… rsss…. e realmente é impressionante o que uma bebida boa não é capaz de fazer com a ressaca. Óbvio que todo excesso faz mal, afinal, é álcool, e álcool é toxina. Mas excesso de produto ruim e industrializado vai ser sempre pior que excesso de produto bom, orgânico, artesanal.
Aqui na Excelência eles fazem cachaça artesanal com fermento próprio – grande parte fermenta a cana com levedura industrializada, que é muito mais rápida, mas gera muito menos aroma, sabores e autenticidade do que o processo “caipira”, feito com leveduras selvagens. A cana ele compra de produtores da região, mas já está vendo de fazer sua própria.
O fermento caipira é bem diferente do fermento selecionado. Igual ao vinho que fermenta naturalmente ou o vinho que leva leveduras selecionados. No caso da cachaça, o selecionado que demora cerca de um dia pra fermentar – e o caipira, mais de sete dias. Claro que o processo natural vai dar muito mais complexidade, aromas e sutilezas que o processo com leveduras selecionadas.
Guillen é um dos nerds do assunto, no ótimo sentido da coisa. Dá pra ver que é daqueles que se enfia em conhecimento pra poder fazer o melhor produto que pode – e no caso dele, com o adicional de querer resgatar os processos artesanais, com mínima intervenção, fermentação natural… sem que isso beire o “achismo” ou o desleixo. Tudo tem seu lugar e seu porquê.
” sou Administrador de Empresas por formação, entrei nesse projeto para ajudar meu sócio e sogro, que sempre teve vontade de produzir cachaça e está se aposentando de seu consultório odontológico, mas no meio do caminho me vi tão envolvido e apaixonado por isso que quando ele me propôs dividirmos os investimentos e virarmos sócios… topei na hora. Por se tratar de um produto genuinamente brasileiro encontrei também um propósito, o de levar nossa cultura para o mundo com um produto de alta qualidade. Vi muitos brasileiros falando mal de nosso país quando morei na Australia. Comecei a estudar a produção de Cachaça por volta de Junho de 2016, pois íamos construir uma nova fábrica na propriedade do Waldir , mas ao verificar a possibilidade de financiamento para a construção o gerente do banco nos alertou para esse Alambique que estava desativado. Fomos conhecer, arrendamos, e quando assinamos o contrato, em Novembro de 2016, fiz alguns cursos de produção, blend e sommelier de cachaça. Passamos por 6 meses de reformas para colocar em atividade esse alambique que estava a pelo menos 8 anos desativada.”
Um detalhe, por exemplo: se você não toma cuidado na hora que a fermentação termina, assim como o vinho, esse fermentado inicial que se faz com a cana, para depois destilar, pode começar a gerar compostos indesejados. No vinho essa também é uma fase complicada, e então podem surgir os compostos de acidez volátil, as acéticas, etc…. na cachaça, podem surgir muitos acetaldeídos, que são subprodutos da quebra do próprio álcool. E são eles que dão a ressaca e a dor de cabeça no dia seguinte. Eeeeeeeeee. Também tem todo um lance de você não utilizar nem o começo nem o finalzinho da destilação, que também tem muitos desses componentes que podem dar uma bela duma zoada no seu dia seguinte.
Nas cachaças industriais ( e em muitas artesanais que usam métodos industriais ), pasmem: você tem que pasteurizar esse fermentado de cana, que se chama por motivos óbvios de “vinho” de cana, antes de inocular a levedura selecionada – pois senão as selvagens “invadem” a fermentação e já era controle do processo, coisa que se busca quando se inocula uma levedura “x” para fazer um processo que já ocorreria naturalmente. Pasteurizar ( tirar a vida microbiana ) pra depois contaminar de novo ( adicionar vida microbiana ) parece meio burro, mas essa é a realidade da produção industrial/comercial de tudo que é fermentado – queijos, iogurtes, bebidas, etc…. ou pelo menos da grande maioria que passa por processos industriais ou comerciais de elaboração.
” na minha opinião e percepção a fermentação com levedura selvagem, resultou em um produto mais aromático e saboroso, pude constatar as diferenças em um teste de produção que fiz por aqui.”
Algumas outras dicas do Guilhen: ” Importante conscientizar as pessoas de comprar e beber cachaças legalizadas, ou seja, com registro no MAPA – Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento órgão que controla a produção de bebidas. Degustar cachaça com a técnica correta faz toda a diferença, sentir os aromas, bebericar apreciando a bebida, uma dose de 40 ou 50 ml deve ser degustada em no mínimo 4 goles, sempre de boca fechada evitando a entrada de ar para não queimar, pois o álcool é volátil e quando você oxigena, potencializa esse efeito dentro da boca. “
As madeiras que eles utilizam lá já estavam na estrutura que eles arrendaram; inclusive, ele “herdou”um estoque de cachaça antiga que é um pequeno tesouro. Ele trabalha com madeiras brasileiras, obviamente. E como diz a própria Isadora Bello Fornari, umas das mais feras em cachaça do Braza, o que faz a cachaça essencialmente nossa é a madeira. Pois a cana não é nossa. O processo e destilar a cana também não é nosso. Mas a madeira usada… ah, essas são nossas. Na Excelência eles usam madeira de Castanheira, Jequitibá Rosa e Carvalho.
Veja, segundo o Guilhen, algumas das características que as madeiras podem dar para as cachaças….
Castanheira
Castanheira ou Castanheira do Pará: Também conhecida popularmente como: amendoeira-da-américa, castanha, castanha-do-brasil, castanha-do-maranhão, castanha-do-pará, castanha-verdadeira, castanheira rosa, castanheiro, noz-do-brasil. No envelhecimento da cachaça: Com propriedades semelhantes ao Carvalho Europeu, transmite à bebida uma cor amarelada, suavidade, um leve gosto adocicado e além de um aroma e sabor característico do próprio fruto da castanheira.
Jequitibá
Jequitibá: – As duas espécies mais conhecidas de jequitibá são: Cariniana Legalis – jequitibá-rosa e Cariniana estrellensis – jequitibá-brancoou somente jequitibá, Outras espécies: Cariniana Rubra – jequitibá-vermelho, Cariniana Parvifolia –jequitibá-cravinho. Cariniana Ianeirensis – conhecido apenas como jequitibá e Couratari pyramidata. São conhecidas também congolo-de-porco, estopa, jequitibá-de-agulheiro, jequitibá-branco, jequitibá-cedro, jequitibá-grande, jequitibá-vermelho, paucarga, pau-caixão, sapucaia-de-apito. No envelhecimento da cachaça: Tão nobre quanto o amendoim para o envelhecimento da cachaça, o Jequitibá-Rosa – Elimina o leve gosto de bagaço de cana, reduz a acidez da aguardente, amacia, preserva o aroma e sabor original e mantém a cor da cachaça quase original, bem clara.
Carvalho
O carvalho é a madeira mais utilizada no mundo para envelhecer destilados. Seu crescimento e cultivo pode ser encontrado no hemisfério norte do nosso planeta (América do Norte e Europa).
Destas espécies, as mais utilizadas pelo ramo da cachaça são o Carvalho Europeu e o Carvalho da América do Norte. A cachaça cultivada em barril de Carvalho Americano tem um sabor suave e aromas semelhantes ao de baunilha e coco. Já o Carvalho Europeu fornece à cachaça aromas e sabores de amêndoas, tanino e madeiras tostadas. Além disso, a coloração da bebida tem cor de âmbar.