Agrotóxicos.
Não é de hoje que o homem usa pesticidas. Como inseticida o enxofre ( sim, que quando queimado produz SO2, também usado para muitas outras coisas, mas é usado até hoje como esterelizante e antibactericida, além de conservante ) era usado pelos Sumérios lá em 2500 a.C.
Se o seu problema eram os piolhos, taca-lhe piretro : um extrato de flores secas de Chrysanthemum cinerariaefolium, por volta de 400 a.C., que prometia eliminar essa desavença. No século XV, foi a vez da descoberta do arsênio, também como inseticida.
Durante toda a história uma vasta coleção de pesticidas foi desenvolvida: extratos de plantas, enxofre natural, cinzas, óleos, ervas.
Até aí tínhamos um controle de pragas baseado em compostos na sua grande maioria orgânicos. Com a revolução industrial, no século XVIII, o sistema agrícola teve um grande impulso: a industrialização fez com que as extensões de terra plantadas começassem a ser maiores, o ritmo de plantação começou a aumentar ( mais plantações, menos ambiente selvagem, mais desiquilíbrio ) – e consequentemente, as pragas e a preocupação com elas também.
No século XIX, já começou o desenvolvimento de alguns compostos inorgânicos – os chamados químicos – para o controle de pragas, juntamente utilizados com vários compostos orgânicos (como a nicotina – das folhas de tabaco, para insetos, e a rotenona – uma raiz, para lagartas) . Vieram as misturas de enxofre e cal e a Calda bordalesa ( sulfato de cobre e cal ), usada até hoje por muitos vinhateiros, para o combate de fungos no vinhedo, principalmente míldio. Assim como o arsenito de cobre ( inseticida ), sulfato ferroso ( herbicida ), fluoreto de sódio ( inseticida) e o super tóxico ácido cianídrico. A partir do piretro ( que já existia lá em 400 a.C, da florzinha ), se fez o similar químico mais eficiente, os chamados piretroides. Deu pra ver que a galera se enfiou nos livros de química e mandou ver nas descobertas de pesticidas cada vez mais eficientes – e tóxicos.
No começo do século XX, veio uma grande novidade: o inseticida orgânico sintético. Pois é. Até um alemão transformar um composto inorgânico (cianato de amônio) em uréia, não se acreditava ser possível sintetizar um composto orgânico – acreditava-se que eles poderiam ser produzidos somente pela natureza. Ledo engano; em 1828 Friedrich Wöhler provou o contrário, e a partir daí foi um pulo para a síntese de inseticidas orgânicos.
A segunda guerra mundial foi um verdadeiro laboratório para os pesticidas ( ou chamados defensivos). Muitos eram utilizados para a defesa dos soldados ( para proteger contra insetos, por exemplo – a malária ) e também como armas químicas. Um pesticida que fosse desfolhante poderia ser útil como tática de guerra, caso o inimigo estivesse em uma floresta.
Pra quem acha que a guerra nem teve tanta importância assim, aqui vai outra informação: quem se lembra do DDT? Pois é. Hoje é proibido, mas foi um dos inseticidas mais famosos e até algumas décadas atrás se utilizava até dentro de casa. Foi sintetizado para combater em 1943, na Europa, os piolhos que transmitiam tifo exantemático nas tropas norte-americanas. Veja como as coisas são curiosas.
Feito com átomos de carbono (C), hidrogênio (H) e cloro (Cl), o DDT é um dos famosos compostos classificados como organoclorados. O aldrin, dieldrin, heptacloro e toxafeno também – e foram todos sintetizados mais ou menos na mesma época. O problema é que eles são muito eficientes, mas se acumulam nos tecidos adiposos de seres vivos ( sim, inclusive nos nossos, olha que maravilha ) e demoram gerações para serem degradados na natureza, pois tem uma estabilidade altísima. Hmmm…. então inventaram os pesticidas ( que nessa altura já podemos chamar de agrotóxicos) organofosforados e os carbamatos.
O organofosforados surgiram em primeira instancia como armas químicas, e são compostos derivados do ácido fosfórico. São mais tóxicos aos insetos que os organoclorados, mas… degradam com mais facilidade na natureza – o que seria bom, se isso não fizesse com que, por causa disso, as aplicações tivessem que ser mais constantes. O herbicida glifosato e os inseticidas malation, paration e dissulfoton são alguns exemplos de compostos organofosforados.
Não só muita coisa foi desenvolvida durante as guerras, mas também muita coisa sobrou da guerra. E o que fazer com todo o estoque de armas químicas e defensivos sem utilidade? Bom, tiveram a ideia genial de aplicar na agricultura. Afinal, era só reformular um pouco para ter uma utilidade no plantio – e num momento em que as pessoas precisavam mesmo de incentivo para reerguer a vida no pós guerra e plantar mais, com mais segurança, em menos tempo.
E sim, os agrotóxicos funcionam. Claro que funcionam. Mas voltamos ao ponto: no extremo do uso, como estamos hoje em dia, o solo está morto, não há mais biodiversidade, a natureza está em desequilíbrio e além de tudo, o excesso de química nas plantações polui o meio ambiente.
Além da contaminação do solo, das águas ( até das chuvas) , do ar, do meio ambiente em geral – e dos resíduos nos alimentos, obviamente (que vão parar em nossa barriga ) novas pragas surgem. Pois sim, elas se adaptam. Você mata uma, surge outra. Ou, pior ainda, o inseto ou a “erva daninha” de torna resistente ao químico. Surgem novas gerações mais fortes e assustadoramente mais resistentes.
Existem milhares de histórias sobre super-insetos e super-plantas com resistências absurdas que surgiram por causa de aplicações de agrotóxicos, e que são pesadelo de muitos agricultores. Outras tantas histórias são as dos efeitos causados nos trabalhadores e em pessoas expostas a esses químicos: a toxixidade pode ser tamanha ponto de influenciar na genética. Mutações, doenças degenerativas, alergias das mais diversas.
Por inúmeras razões, cada vez mais as alternativas para uma agricultura mais saudável se mostram como a principal – e talvez a única saída para reestabelecer o mínimo de equilíbrio entre o que plantamos e nós mesmos. Até lá, temos que nos informar, nos aprofundar, nos interessar pelo que comemos e pelo que bebemos. Pois muita gente ainda acha que vinho é feito só de uva fermentada … e olha eu só falei até agora do que acontece no vinhedo – pois na hora de transformar a uva em vinho, o problema é igual ou até maior, dada a enorme quantidade de insumos e aditivos permitidos por lei que se adicionam ao vinho.