Consumo de carnes.
Existem muitas razões para consumirmos mais vegetais e menos carnes. A tal da alimentação “plant based”, baseada em vegetais, ou seja, priorizando e dando mais espaço no prato para legumes, verduras, leguminosas, grãos, sementes, frutas, etc.é comprovadamente a maneira mais saudável de nos mantermos bem e também de mantermos o planeta saudável, além de estrutura social, econômica e cultural, também equilibrada. Consumo de uma dieta predominantemente vegetal aliada, claro, a uma estrutura de cultivo limpa, proveniente de pequenas propriedades que não utilizam veneno no campo, ao invés de grandes propriedades que fazem mal ao meio ambiente, deterioram o solo e acabam com a biodiversidade.
Por que uma alimentação assim é melhor? Vamos por partes: uma alimentação baseada em vegetais não quer dizer vegetariano ou vegano. Eu não acredito em “selos” nem em radicalismo extremo na alimentação. Acho mais saudável alguém comer carne de um pequeno produtor do que um vegano que entope de comida industrializada – tanto para a pessoa quanto para o planeta. Eu mesma sou vegetariana, mas meu restaurante não. Não como carne por opção, mas acredito que em uma propriedade agrícola saudável e equilibrada, devem existir animais. É só pensar nas propriedades agrícolas que conseguem fechar os ciclos de produção e consumo para ver que a existência dos animais é indispensável, tanto para derivados, manutenção do solo e capim, adubação, etc.
Mas embora não possamos dizer que o consumo de carne faz mal, assim no genérico, não dá pra dizer também que o consumo de carne faz bem, muito mais como estamos acostumados aqui no Brasil ou na maior parte do planeta. Não faz bem pra ninguém na quantidade que estamos acostumados e muito menos com o tipo de criações que estamos acostumados a ter desses animais.
Não tem nada a ver com radicalismo, abraça árvore, teoria da conspiração ou superficialidades pseudo éticas. Tem a ver com puro e simples bom senso. Pessoas informadas tendem a fazer a coisa certa. Pessoas mal informadas, tendem a consumir o que não consumiriam caso soubessem da onde vem ou como são feitas as coisas.
Por exemplo, vamos começar com a questão do bem estar animal. Por acaso a maioria das pessoas sabem como são criados os animais que estão consumindo? Sabe se são confinados, submetidos a remédios e a práticas de industrialização, alimentação não natural para espécie ( tipo peixe que come ração a base de frango …. Me diga, em que mundo isso aconteceria na natureza? ).
Você sabe se os animais que você consome comeram ração feita com grãos, e se eles são ou não transgênicos? Ou se os animais que você consome poderiam mesmo estar comendo esses grãos – se o sistema digestivo deles suporta isso, ou se eles são alimentados com grãos mesmo se eles não conseguem digerir isso bem ? – sim, vacas não foram feitas pra comer grãos, mas pasto. E esses grãos, você sabe se eles estão sendo cultivados com agrotóxicos, devastando áreas de preservação? E o pasto? Esse pasto foi cultivado ou é nativo? Ele está desmatando florestas? Ok. Isso é só pra começar.
Mas e os antibióticos? E os promotores de crescimento? E as práticas cruéis como cortar bicos, separar ninhadas, caminhadas exaustivas, estruturas ósseas frágeis, abate precoce, trituração de animais vivos, furos no sistema digestivo para retirar massa não digerida de ração?
Será que todos sabem que mais da metade dos campos cultiváveis – em extensas monoculturas, óbvio, cheias de agroquímicos – são destinadas a alimentação de animais que depois vão alimentar humanos? E que se plantássemos vegetais variados nesse mesmo espaço, hipoteticamente, não haveria fome no mundo? É. Pouca gente sabe ou finge não saber. Uma loucura.
Sem falar dos derivados animais. Galinhas que botam mais ovos do que deveriam, vacas que dão mais leite do que deveriam – à base de sistemas de criação intensiva e muitos aditivos – produzindo assim ovos e leites doentes e frágeis, pois animais doentes e frágeis dão derivados similares. E não adianta achar que os derivados são menos cruéis numa escala industrial. São derivados de animais criados sob as mesmas condições que os de corte – e muitas vezes, até piores.
Pois é. A maioria das pessoas não faz idéia do que é uma indústria que vê o animal como produto alimentício, e não como um ser vivo.
Não adianta fazer aqui propaganda contra. É só pesquisar. Quem se informa acaba criando aversão, naturalmente, à indústria alimentícia convencional de carnes e derivados. E só voltando no assunto: não estamos falando de comer ou não comer carne, mas sim de ONDE vem essa carne e em quais condições.
Comer ou não comer carne é uma escolha pessoal. Fingir ignorância sobre a indústria alimentar e a indústria de animais, não. É um tema controverso e difícil falar sobre isso sem ser superficial, pois é algo muito mais profundo do que muita gente pensa, e que infelizmente leva as pessoas à beira do fanatismo cego – de ambos os lados.
Mas não podemos ignorar os maus tratos aos animais, não podemos ignorar nosso distanciamento em relação ao alimento, não podemos ignorar a terceirização da nossa vida e da nossa saúde dentro de um sistema que não é transparente, não podemos ignorar as monoculturas que destroem os nossos solos, os venenos que poluem nossas águas e nossos corpos. Não podemos esquecer que quem come carnes e produtos derivados provenientes da indústria … não está comendo só “carne”. Está comendo um produto industrializado fabricado a partir de práticas, na maior parte das vezes, bastante cruéis com os animais e com o meio ambiente. Da mesma forma que grandes indústrias de produtos livres de derivados animais continuam crescendo…. com base no mesmo sistema linear de exploração do planeta, fabricação de produtos repletos de aditivos, que continuam poluindo nossos solos, percepções e corpos, gerando montanhas de lixo.
Mais uma vez, a questão não é comer ou não comer. Muitas religiões pregam o não consumo de carne, assim como muitos médicos indicam. Cada corpo é um corpo e a nossa missão é apenas se dar conta do que faz bem pra gente individualmente. O que te faz bem, o que seu corpo pede. Se o seu corpo pede, então é correto. Da mesma forma que se o teu corpo não pede e você come mesmo assim, aí sim você está pecando contra ele. Infelizmente “ouvir” o nosso corpo requer mais silencio, mais introspecção, mais conexão com a gente mesmo do que a maioria tem, embotados pelo dia a dia, pelo marketing da indústria e por dietas malucas. Mas tempos como os de agora, de um colapso absoluto no sistema, servem pra isso mesmo. Para nos voltarmos para dentro e perguntarmos de uma vez por toda, todas essas questões.
Temos que lembrar também de sermos menos intolerantes uns com os outros, independente das escolhas…. e lembrar de refletir ao invés de agredir. As pessoas precisam de informação, não retaliação. Ninguém é mais ou menos evoluído comendo ou não comendo alguma coisa, muito menos sendo intolerante no assunto.