Medicina tradicional: Chás, infusões, tinturas….
Um chazinho é comprovadamente uma das melhores curas para todos os males. ⠀
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Até na bíblia brazuca “Medicina Rústica”, de Alceu Maynard, ele já discorre – sobre o chazinho : “ muitas vezes pode não ser útil, mas mal não faz, então porque condená-lo, não raro rispidamente? É preciso não desprezar seu efeito sócio-psicológico, pois é, sem dúvida alguma, o símbolo da dedicação”. ⠀
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Genial, né. Genial, verdadeiro e poético. ⠀
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Mas, poesia à parte, obviamente que a medicina tradicional não se baseia apenas no efeito sócio-psicológico das coisas – que claro, não pode ser desconsiderado. Ela se baseia principalmente nos efeitos reais e bem visíveis, curativos/preventivos das diversas plantas. ⠀
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E não é assim tão simples. Aliás, não é nada simples. Quando a gente começa a se aprofundar, vemos que realmente não sabemos nada. Eu pelo menos, não sei de nada. ⠀
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Existe toda uma ciência muito refinada em torno das medicinas tradicionais, muitas vezes com séculos ou milênios de história, aplicação e aprimoramento. Temos que ser humildes e aplicados para entender e estudar. ⠀
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Não é simplesmente “ah, a planta tal faz bem pra tal coisa” , e pronto. Calma lá. Cada planta e cada parte da planta pode atuar de uma maneira muito específica, dependendo de como são extraídos os componentes e da maneira que são empregadas. Até a combinação delas, o horário e como você ingere, a maneira com que são cultivadas ou colhidas, faz diferença. ⠀
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Em tempo. O que chamamos de “chá”, popularmente, na verdade é uma infusão. Chá mesmo a gente só pode chamar a infusão das folhas da planta do chá, a Camellia Sinensis. ⠀
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“É importante destacar que os efeitos benéficos ou indesejáveis dos chás dependem da adequada indicação, modo de preparo, dose, uso da planta correta e até mesmo a forma como a planta foi cultivada e colhida”, André Gonzaga dos Santos, professor da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Unesp (Universidade Estadual Paulista). ⠀
Além das infusões, os populares chás, temos também várias outras maneiras de usar as ervas, raízes, cascas, flores. Temos as tradicionais garrafadas, as tinturas com álcool, vinagre, os óleos essenciais, os óleos macerados, as macerações à frio, as decocções ….⠀
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É, minha gente, nem só de chá vive um ser humano. Tava achando que era só ferver a plantinha e pronto? Bom, quase. Pelo menos no caso das infusões e das decocções. Pois tanto nas infusões como nas decocções, estamos lidando com plantas e água quente.⠀
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INFUSÕES E DECOCÇÕES:
Infusões: você ferve a água e depois despeja em cima das ervas, secas ou frescas, tampando o recipiente e esperando alguns minutos. Preserva bastante os óleos essenciais e é ótima para preparos de “urgência”, pois são rápidos de fazer. Folhas, flores, cascas moídas, frutos são ideais. ⠀
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Decocções: você ferve a planta, raízes, caule ou cascas durante alguns minutos, para extrair de maneira mais eficiente os compostos de materiais mais duros, lenhosos ou fibrosos. Se aplicado a partes da planta muito sensíveis, você pode perder parte dos componentes benéficos.
Fazer tinturas vegetais é meio brincar de alquimista. A gente se sente meio Cornelius Agrippa misturando as ervas, secando, colocando em infusão no álcool e depois armazenando vidrinhos âmbar pela casa. ⠀
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TINTURAS:
As tinturas vegetais são “infusões” de plantas no álcool. São plantas secas ou frescas, infusionadas em álcoois diversos, preparadas à temperatura ambiente. Pode ser feita pela ação do álcool sobre uma só erva (tintura simples) ou sobre uma mistura de ervas (tintura composta). Este método assegura uma longa preservação das ervas e de seus nutrientes. ⠀
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Você pode usar uma variedade grande de álcoois para as tinturas, e vai muito também da sua intenção. Se é pra uso externo ou interno, por exemplo. Se for pra beber, obviamente que você vai usar um álcool bebível, e não um zuluzão de churrasco. Seja qual for a bebida escolhida ( eu já usei vodka, cachaça, gin, grappa, álcool de cereais ) , ela deve ter no mínimo 40% de álcool, pois além dele extrair os componentes benéficos das plantas, ele vau para impedir o crescimento de fungos ou outras cositas más no material vegetal na garrafa. Senão pode acabar virando um semi fermentado de alguma coisa, e não uma tintura. Acreditem, ja tentei e o negócio virou algo entre um queijo de mofo azul e um vinagre. ⠀
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A tintura pode ser tomada, diluída em água fria, usada com conta gotas ou usada externamente na forma de unguentos, fricções e posteriormente na formulação de pomadas e cremes. É uma das queridinhas da medicina tradicional pois é uma maneira muito eficaz de concentrar os componentes das plantas, além da facilidade de transporte, sua utilidade para tratamentos de longa duração, e a sua capacidade de ser absorvida rapidamente pelo organismo.
Outra vantagem das tinturas é que elas mantêm os nutrientes das plantas em uma forma estável, solúvel e retêm os ingredientes voláteis e semi-voláteis, que, de outra forma, são perdidos no tratamento térmico e no processamento de extratos de ervas secas. Como é um método que extrai bastante da planta, é muito bom para materiais fibrosos ou lenhosos, raízes e resinas. Mas pode ser aplicado em qualquer tipo de erva, caule, folha ou flor. ⠀
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Curiosidade da língua portuguesa: as soluções de substâncias voláteis são denominadas “espíritos”. Por isso chamamos muitas bebidas com grau alcoólico elevado de bebidas espirituosas. Isso rende ótimas metáforas e trocadilhos. ⠀
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Até agora não cheguei na origem exata das tinturas. Mas certeza que remete à alquimias das mais antigas. Interessante que nas comunidades indígenas brasileiras, por exemplo, não se usavam as tinturas como conhecemos hoje- pois não havia o domínio do processo de destilação. Provavelmente isso foi incorporado pós domínio europeu, mas se incorporou de tal maneira na cultura brasileira que hoje em dia boa parte da medicina fitoterapia indígena, tradicional, cabocla, rústica e “caseira” – denomine como quiser – abrange também o uso de tinturas. ⠀
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Quem souber mais sobre a história e a origem das tinturas, por favor me dê um alô. ⠀
Como grande parte das medicinais tradicionais, as medidas não são lá muito exatas. O bom senso, a intenção e a “mão” de quem faz é extremamente importante, e daí vai um pouco da nossa paciência em aprender e ir pegando o jeito da coisa. ⠀
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Em linhas gerais, se for pra dar uma idéia, a proporção habitual de planta seca numa tintura é de cerca de 10% em relação ao volume de álcool diluído ( uma bebida com 60% de álcool é um álcool diluído, por exemplo…). Nas tinturas com plantas frescas, podemos usar álcool puro, pois a planta vai soltar água durante o processo – então temos que tomar cuidado para a diluição não baixar muito daqueles 40% que falamos ali em cima. ⠀
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O recipiente para a elaboração das tinturas deve ser de vidro ou cerâmica. Evite usar recipientes metálicos ou de plástico, pois estes podem reagir com a tintura ou liberar substâncias perigosas ao longo do tempo e que não vamos querer colocar para dentro do nosso corpitcho. A armazenagem deve ser feita em frascos escuros, em local fresco, seco e de preferência com ausência ou pouca luminosidade. Armários ventilados são ideais. ⠀
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Uma vez preparada a infusão do álcool e da erva, é só deixar “apurando”. O tempo varia de planta pra planta, de preparado para preparado, mas vai em geral de alguns dias até meses. Materiais mais duros requerem mais tempo. Mais brandos, menos. Mas cada caso é um caso, e quanto mais tempo, mais concentrada ficará sua tintura. ⠀
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Os usos são diversos. Tinturas calmantes que você toma uma colherinha diluída em água durante a noite. Tinturas estimulantes de apetite ou de ânimo. Tinturas para serem aplicadas na pela contra picadas de mosquitos e inflamações, diluídas e aplicadas como preventivo de formigas. São infinitas as possibilidades. ⠀
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Ah! Existem também as infusões de ervas em vinagre e até em vinho. Aliás, os vinhos “medicinais” ou tônicos são um capítulo à parte na história, pra lá de interessante. Mas isso falamos mais depois.